Idosas Resistindo à Demolição em Fortaleza: Conflito no Bairro Meireles
Duas moradoras idosas estão enfrentando a demolição do prédio onde residem, em uma área nobre de Fortaleza (CE). Elas acusam a construtora Reata Engenharia, responsável pelo novo empreendimento, de coação. A disputa se desenrola no bairro Meireles, a apenas duas quadras da costa, onde a empresa planeja construir um edifício de 21 andares no local do condomínio, que foi erguido na década de 1970.
O terreno de 5.060 m² abriga cinco blocos com um total de 60 apartamentos. Dentre eles, 24 ainda estão ocupados. A maior parte dos moradores aceitou receber uma unidade no novo prédio, além de um auxílio mensal de R$ 2.500 para aluguéis até a entrega das novas residências.
Entretanto, as duas idosas, com 78 e 84 anos, decidiram não assinar o contrato. Elas afirmam estar abertas à negociação, mas consideram a oferta de R$ 450 mil como insuficiente, uma vez que o valor não condiz com os preços de mercado na região, onde um apartamento pode alcançar o dobro ou o triplo desse montante. Além disso, questionam a segurança jurídica do acordado.
Areti Balidas, filha de Maria Elisier Balidas, de 84 anos, declarou: “Por mais que os outros achem vantajoso, pra gente não é. Não estamos contra o empreendimento, mas não confiam na empresa. Isso é coação, é conduzido como crime”. Areti ressaltou que sua mãe já enfrenta problemas de saúde e a mudança para um aluguel poderia intensificar sua ansiedade.
Em uma nota enviada à Folha, a construtora afirmou que o projeto foi inicialmente sugerido por moradores do conjunto, após uma experiência positiva em uma reconstrução na mesma área. A Reata negou que o impasse seja resultado de intransigência e mencionou que há espaço para negociação “dentro do que seja coerente e justo”.
A aposentada Maria Marta dos Santos, de 78 anos, também compartilhou sua experiência em uma carta enviada à reportagem. No texto, ela reconhece o valor do projeto, mas se recusa a aceitar a proposta por entender o contrato como frágil e sem garantias. “Não considero viável erguer um novo prédio de 20 andares em apenas 20 meses. Diante da minha idade e incertezas, não quero arriscar meu único bem”, escreveu.
Marta observou a saída de vizinhos que aceitaram a proposta, relatando que alguns chegaram a desmontar janelas e portas de seus apartamentos. “Estamos apenas nos defendendo em uma situação imposta”, destacou.
A síndica do condomínio, Renata Maia, uma das moradoras que aceitou a proposta e já deixou o local, afirmou que não houve coação. “Os serviços seguem normalmente, com limpeza e coleta de lixo”, acrescentou.
Jacqueline Pereira dos Santos, filha de Marta, observou que a construtora precisa desocupar os blocos onde residem as idosas para iniciar a construção. “Nos dois blocos só estão minha mãe e a Elisier. Nos outros três ainda há cerca de 10 pessoas que também não assinaram”, informou. Segundo Jacqueline, o objetivo da construtora é erguer um prédio para os antigos moradores e, após a mudança, demolir os blocos restantes.
Ela enfatizou que as moradoras não receberam garantias formais sobre a proposta. “Quando perguntei, não me deram nenhuma garantia. É um contrato fragilizado. E se ocorrer algo imprevisto?”, questionou.
A Reata ressaltou que está arcando com os aluguéis dos moradores que aderiram ao projeto e se mostrou disposta a oferecer suporte financeiro e logístico às famílias que resistem.
O advogado das idosas, Stênio Gonçalves, denunciou pressões e tentou forçar a saída das moradoras. “Elas estão enfrentando constrangimentos. A construtora organizou uma assembleia em um prédio vizinho, colocando uma placa que dizia que não desistiria de remover os ‘obstáculos’, transformando as moradoras em barreiras ao projeto”, acusou Gonçalves.
Ele já apresentou uma representação ao Ministério Público do Ceará, na Promotoria do Idoso, que investigará se a situação infringe o Estatuto do Idoso. Além disso, obteve na Justiça uma suspensão de qualquer intervenção nos imóveis das moradoras, argumentando que a demolição requer a concordância unânime dos condôminos, conforme o artigo 1.343 do Código Civil.
A Reata Engenharia afirmou possuir laudos técnicos que apontam comprometimento estrutural dos blocos antigos. Contudo, o engenheiro contratado pelas moradoras assegura que não há riscos imediatos, defendendo a possibilidade de reforma dos imóveis.
A Defesa Civil de Fortaleza já realizou três vistorias nos últimos dois anos, a última delas em maio de 2023, considerando o risco como “médio” devido a infiltrações, ferragens expostas e afundamento de piso. Em resposta, a Defesa Civil notificou os responsáveis para que realizem reparos urgentes e evitem a deterioração.
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